O Nosso Ocaso

Eu desisti antes de nascer.
- Samuel Beckett

O amo não dizia nada e Jacques dizia que o seu capitão dizia que tudo o que nos acontece de bem e de mal cá em baixo está escrito lá em cima. 
- Denis Diderot
Para desenlear certos nós da mente, vamos simplificar até ao ponto mais simples: estamos a dançar, fantasiamos pares de cornos, metemo-los sobre nossas cabeças. E dançamos até os olhos ficarem negros. Diamantes de Sangue, para que fiques a saber, na pista de dança. Definir não é fechar (de-finir: dar fim), mas abrir: o knock knock do baixo que vibra nestas paredes.

Poético é o conceito que precisamos de enclausurar. Vamos pela comunicação: se o silêncio corresponde perfeitamente à vagueza das almas, se a forma corresponde ao conteúdo, a mensagem passa clara, desterrada de entropia. As luzes rolam e as plantas dos nossos pés estão em perfeita osmose com o sabor das ondas de som.

Se não há regras para a vida, há que conhecer os seus potenciais e limitações. Daqui um autor pode fazer o que quiser, mas um mortal não. É como tocar um relâmpago, as chances de encontrar a rolha quântica da realidade.

Posto isto, acrescente-se um vector: para baixo.
Como toda a natureza segue: para baixo.
Gravidade, mar, funeral: tudo para baixo.

Prometer a decadência não é uma pretensão estética, é ética. Se sabes precisamente onde está o vício num jogo, e se estás desde o início preso ao papel que os verdadeiros encenadores te deram: faz uso do vício do jogo. Destapa aquela rolha e deixa tudo circular a drenagem, escoar cano abaixo.

Emblematiza a insolência: foi o papel que te deram.
Reescreve a adição na liberdade: foi o papel que te deram.
Larga o determinismo e o mágico: foi o papel que te deram.
Foi o papel que te deram: circular a drenagem, escoar cano abaixo.

Neste Submundo em que aguardamos, não há copas que valham, só abutres de passados remorsos nas árvores despidas. Espelhos de memórias cristalizados nos nossos mortos. Mas nada disto é um ensaio para um espectáculo verdadeiro e ulterior.

Por muito que queiramos que algo floresça aqui, nada frui, tudo decai. É um ocaso. Mas eu preferia chamar-lhe de o nosso ocaso.

Nada disto são papéis, são inocências. Nada disto são adições, são culturas. E o nosso tabuleiro, o teu e o meu... larga os dados, que está viciado. Eis o único Ás de Trunfo.

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